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sexta-feira, 8 de junho de 2012

Banho de gato

Banho de gato

Como deveria ser:

Como é:

Os olhos de Uriel


Os olhos de Uriel
Os olhos azuis límpidos de Uriel me olharam durante toda a viagem.
Há mais de um mês eles me seguiam e me acordavam, no meio da noite.
Agora me perguntavam, por que fizeram isso comigo? O que está acontecendo?
A estrada nunca chegava ao fim. Havia túneis e viadutos. E os olhos de Uriel, cheios de lágrimas, indagavam.
Agarrado a mim, como se fosse a única ponte com a seu pequeno mundo que desmoronara há um mês, quando Marcelo se fora, com móveis, mesas, cadeiras, camas, plantas, panelas, fogão, geladeira, televisão, casa. Ficara na sala apenas uma velha almofada e Idelma, que pouco se importou com o que estava acontecendo em suas vidas e continuava a comer e dormir.
O mundo de Uriel desmoronara e eu era sua única chance de sobrevivência.
Porque só eu sabia o que ele estava sentindo, enquanto as luzes e as árvores corriam pelas janelas do carro e ganhávamos a estrada desconhecida rumo ao seu novo lar.
Na longa viagem, pude costurar os pedacinhos da história de Uriel que, é lógico, recebeu esse nome por causa do anjo.
Não era a primeira vez que Uriel atravessava a ponte. Nascera do outro lado da baia e, como muitos gatinhos, foi vendido, com documentos, pedigri, caixinhas e coleiras, para morar numa grande casa, com jardins e pátios ensolarados, grandes almofadas e sofás convidativos. Uriel era um presente de amor.
 

De Marcelo para Fátima
com paixão
para sempre

1993
 

E lá estava Uriel, olhos azuis cheios de confiança no mundo, nos amigos, dentro de uma caixinha toda forrada de papéis coloridos, laços de fita vermelha, cercado de cheiros novos que ele analisava e arquivava para sempre.
A sala onde o soltaram era imensa, com altas paredes repletas de quadros.
Marcelo e Fátima se abraçaram, se beijaram, rolaram para o sofá e Uriel ficou andando por ali, catalogando cada objeto: o pufe, vermelho de veludo, a arca colonial, os castiçais, o sofá menor - que seria seu refúgio nos primeiros meses de solidão - a grande janela de vidro através do qual podia ver os pássaros no jardim e, além do jardim, o alto muro que o separava de outro mundo. Mediu os tapetes, as cortinas, aventurou-se pela cozinha, em busca de água.
Por duas vezes tentou chegar ao tampo da pia, mas ainda não tinha impulso suficiente para o salto. E gastou algum tempo afiando as pequenas unhas nos pés da mesa. Até que conseguiu subir e tirar proveito, aqui e ali, dos restos do café da manhã: lascas de presunto, um bom pedaço de queijo e leite derramado no pires.
Dormiu muitas horas enrolado dentro da cestinha de pão até ser encontrado, à noite, na hora do jantar.
Agora, no meu colo, enrolado num velho pedaço de vestido, Uriel rememorava o aconchego daquele cesto, mas todas as referências tão cuidadosamente catalogadas haviam desaparecido.
Dois anos depois de ter chegado àquela casa, Fátima, sua dona se foi. Uriel nunca entendeu a razão da sua partida. Na casa grande demais, Marcelo e ele vagavam de um lado para o outro, durante a noite. Uriel, como sempre, instalado nos ombros de Marcelo como se fosse um cachecol. De manhã, insones, Uriel se recolhia ao sofá menor para dormir. Marcelo saia para trabalhar e só voltava à noite. Eram longas horas de silêncio, solidão, frio e fome.
Mas à noite, quando Marcelo chegava para mais uma caminhada,  Uriel ganhava comida e bacia limpa. Era tudo na sua vida. Seu desejo mais profundo, sua fonte de felicidade e energia, sua razão de estar vivo. A hora da chegada de Marcelo, a refeição farta, a água limpa, a bacia limpa e o ombro para caminhar pela casa. O mundo era assim.
Alguns meses depois, Marcelo resolveu fazer uma coisa para Uriel ficar mais feliz: comprou uma gatinha. Idelma, sabe-se lá o porquê. Era parecida com Uriel, mas os olhos eram redondos demais, agudos demais, sobreviventes com certeza e Uriel teve medo da força de Idelma. Ela cresceu muito rápido e mais rápido ainda estava disposta ao casamento. Uriel, no entanto, tinha outros planos para si mesmo e se recusou assumir o papel do procriador. Queria seu mundo de volta. Queria Fátima e Marcelo no sofá e ele no cesto de pão. Queria, pelo menos, andar noite após noite no ombro de Marcelo. E nem isso tinha mais, porque agora Marcelo sai todas as noites, e ia sabe-se lá para onde. Restava a Uriel esconder-se de Idelma, sempre voraz, sempre cheia de vontades pela vida.
Com o tempo, Uriel acostumou-se à rotina. Encontrou vários refúgios na casa e Idelma descobriu que podia sair pelos telhados vizinhos. Cada um seguia seu caminho. Tudo era calmo, no seu lugar.
Tudo como deve ser na vida de um gato.
Até que aconteceu a grande tragédia.
Uma avalanche de fatos passou por cima de Uriel, a partir daquela visita.
Saída não se sabe de onde, uma mulher chegou certo dia abraçada com Marcelo, trazendo uma bolsa grande com algumas roupas e livros. Abriu a casa toda, mandou levar todas as plantas para o jardim, arrancou as roupas da cama, mandou embora o pequeno sofá de dormir e a mesa de afiar unhas, jogou no lixo o cesto de pão de dormir à tarde, fez o mesmo com a cortina de apoio para olhar a janela, colocou a bacia no distante quintal dos fundos, sumiu com toda comida só porque tinha cheiro de biscoito e mandou passar uma coisa malcheirosa na casa toda. Uma faxineira ia fazendo isso tudo, enquanto Uriel, perplexo, tentava salvar uma coisa aqui, outra ali, esquivando-se das vassouradas.
Depois de alguns dias, perdido na imensidão da casa limpa, enquanto Idelma pensava apenas em comer, fosse o que fosse, Uriel viu o portão da rua se abrir, uma traseira de caminhão imbicar no jardim e três homens, em pouco tempo, levarem tudo que restara do mundo de Uriel.

A faxineira voltou. Varreu tudo, lavou tudo, colocou uma almofada no chão da sala, a bacia no quintal, um prato com carne ao lado, fechou janelas e portas e se foi.
Nem um adeus, nem uma palavra amiga, nem um sinal de Marcelo. Como Fátima, ele desaparecera além muro do jardim. Para sempre.
A partir daí, a cada final de dia, um homem alto, moreno, abria o portão da rua, a garagem, entrava no quintal dos fundos,  raspava a comida velha e ressecada - quando havia sol - e encharcada - quando chovia - e colocava nova refeição. Resmungava alguma coisa sobre cheiros e moscas e desaparecia.
Idelma não podia mais passear no telhado, porque a porta de acesso ao segundo andar estava fechada. Se não, com certeza, teria caído no mundo lá fora e seguido seu destino de sobrevivente.
Uriel apenas dormia durante o dia, na almofada velha que ficara no chão da sala e vagava pela parte livre da casa, noite afora, buscando nas sombras o ombro de Marcelo. Comer, só o suficiente para estar de olhos abertos na noite seguinte - quem sabe? ele voltaria e eles pudessem retomar a vidinha simples e cúmplice que haviam construído depois da partida de Fátima.
Às vezes, no final do dia, Uriel ouvia uma voz que falava com ele do outro lado do muro do jardim. Era uma voz amiga, mas ele mal podia distinguir o que diziam. Tinha certeza, porém, que era com ele, embora não dissesse seu nome.
Um dia, quando a comida chegou, Uriel aproveitou-se da situação para ganhar a calçada e esperar pela voz.
Foi assim que nos conhecemos. Eu, vindo do trabalho, Uriel, à procura de salvação.

Por dois meses o olhar límpido, azul, de Uriel me seguiu e me acordou pedindo ajuda, indagando, querendo respostas e aconchego.
Até que um dia, que é hoje, conseguimos fazer esta viagem, rumo a um lar desconhecido, onde Uriel vai morar, dividindo seu mundo com quatro cachorros, três gatos, duas gatas, cinco filhotes, quatro crianças, dois adultos, muita gente chegando e saindo e voltando, sempre voltando. E nem sinal de Marcelo, que se casa agora, estes dias. Rezo por você, Uriel.
Uriel morreu cinco dias depois de se mudar para Itaboraí. De saudade.
Ana Lagoa



quarta-feira, 6 de junho de 2012

Anjos caninos


ANJOS CANINOS
Existem pessoas que não gostam de cães,
Estas, com certeza,
Nunca tiveram em sua vida
Um amigo de quatro patas
Ou, se tiveram,
Nunca olharam dentro daqueles olhos
Para perceber quem estava ali.
Um cão é um anjo
Que vem ao mundo ensinar amor.
Quem mais pode dar amor incondicional,
Amizade sem pedir nada em troca,
Afeição sem esperar retorno,
Proteção sem ganhar nada,
Fidelidade vinte e quatro horas por dia?
Ah, não me venham com essa
De que os pais fazem isso,
Porque os pais são humanos
E quando os agredimos
Eles ficam irritados e se afastam...
Um cão não se afasta
Mesmo quando você o agride,
Ele retorna cabisbaixo
Pedindo desculpas por algo que talvez não fez
Lambendo suas mãos a suplicar perdão.
Alguns anjos não possuem asas,
Possuem quatro patas, um corpo peludo,
Nariz de bolinha, orelhas de atenção,
Olhar de aflição e carência.
Apesar dessa aparência,
São tão anjos quanto os outros (aqueles com asas)
E se dedicam aos seus humanos tanto quanto
Qualquer anjo costuma dedicar-se.
Às vezes um humano veste a capa de anjo
E sai pelas ruas a catar alguns anjos
abandonados à própria sorte,
E lhes cura as feridas, alimenta, abriga
Só para ter a sensação de haver ajudado um anjo...
Deus quando nos fez humanos
Sabia que precisaríamos de guardiões materiais
Que nos tirasse do corpo as aflições dos sentidos
E nos permitissem sobreviver a cada dia
Com quase nada
Além do olhar e da lambida de um cão...
Que bom seria se todos os humanos
Pudessem ver a humanidade perfeita de um cão!

Brincando na neve

Brincando na neve

sábado, 2 de junho de 2012

Os 10 Mandamentos do Cão e do Gato


Os 10 Mandamentos do Cão e do Gato
01) Minha vida deve durar entre 10 e 15 anos. Qualquer separação será muito dolorosa para mim;

02) Me dê algum tempo para entender o que você quer de mim;

03) Tenha confiança em mi. É fundamental para o meu bem estar;

04) Não fique zangado comigo por muito tempo. E não me prenda em nenhum lugar como punição. Você tem seu trabalho, seus amigos, suas diversões. Eu só tenho você;

05) Fale comigo de vez em quando. Mesmo que eu não entenda suas palavras, compreendo muito bem seu tom de voz e sinto o que você está me dizendo. Isso ficará gravado em mim para sempre;

06) Antes de me bater, lembre sempre que eu tenho dentes que poderiam feri-lo seriamente, mas que nunca vou usá-los em você;

07) Antes de me censurar por estar sendo vadio, preguiçoso ou teimoso, pergunte antes se não há alguma coisa me incomodando. Talvez eu não esteja me alimentando bem. Posso estar resfriado. Ou também meu coração que está ficando velho e cansado;

08) Cuide de mim quando eu ficar velho. Você também vai ficar;

09) Não se afaste de mim em meus momentos difíceis ou dolorosos. Nunca diga "prefiro não ver" ou "faz quando eu não estiver presente";

10) Tudo é mais fácil para mim com você do meu lado.

Autoria Desconhecida


Vish


O Pássaro Cativo


O Pássaro Cativo
O Pássaro Cativo
Armas, num galho de árvore, o alçapão
E, em breve, uma avezinha descuidada,
Batendo as asas cai na escravidão.
Dás-lhe então, por esplêndida morada,
Gaiola dourada;

Dás-lhe alpiste, e água fresca, e ovos e tudo. 
Por que é que, tendo tudo, há de ficar
O passarinho mudo,
Arrepiado e triste sem cantar?
É que, criança, os pássaros não falam.

Só gorjeando a sua dor exalam,
Sem que os homens os possam entender;
Se os pássaros falassem,
Talvez os teus ouvidos escutassem
Este cativo pássaro dizer:

"Não quero o teu alpiste!
Gosto mais do alimento que procuro
Na mata livre em que voar me viste;
Tenho água fresca num recanto escuro

Da selva em que nasci;
Da mata entre os verdores,
Tenho frutos e flores
Sem precisar de ti!

Não quero a tua esplêndida gaiola!
Pois nenhuma riqueza me consola,
De haver perdido aquilo que perdi...
Prefiro o ninho humilde construído

De folhas secas, plácido, escondido.
Solta-me ao vento e ao sol!
Com que direito à escravidão me obrigas?
Quero saudar as pombas do arrebol!
Quero, ao cair da tarde,
Entoar minhas tristíssimas cantigas!
Por que me prendes?  Solta-me, covarde!
Deus me deu por gaiola a imensidade!
Não me roubes a minha liberdade...
Quero voar! Voar!

Estas cousas o pássaro diria,
Se pudesse falar,
E a tua alma, criança, tremeria,
Vendo tanta aflição,
E a tua mão tremendo lhe abriria
A porta da prisão...

Autoria: Olavo Bilac


Thriller


Thriller


Cão x Gambá

Cão x gambá